Mais de 3 mil pessoas se reuniram em um espaço de eventos na Mooca, zona leste de São Paulo, no décimo e último Congresso Nacional do Movimento Brasil Livre no último sábado, 23. A partir de 2025, o evento deixará de existir para dar lugar à convenção nacional da Missão, partido que deve começar até outubro, segundo estimativa de seu futuro presidente, Renan Santos.
Ao todo, foram coletadas mais de 800 mil fichas de apoio, mais do que o mínimo de 547 mil assinaturas necessárias para o processo de criação do partido. A partir de agora, estas fichas serão enviadas aos cartórios eleitorais de cada região, a fim de garantir que elas sejam autênticas. Hoje, cerca de 200 mil assinaturas já foram aprovadas pelo Tribunal Superior Eleitoral.
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A Missão pretende lançar seu candidato à presidência ainda em 2026. No próximo ano, apoiadores e filiados ao partido participarão das prévias da legenda, nas quais devem escolher entre o youtuber Arthur do Val e o empresário Cristiano Beraldo. Arthur está inelegível até 2030 por causa da cassação de seu mandato de deputado federal por São Paulo, ocorrido em maio de 2022, dois meses depois da viagem ao Leste Europeu, durante a qual teve áudios privados vazados à imprensa.
No entanto, sua expectativa é reverter essa condição. “O processo foi absolutamente atropelado, ele é repleto de erros formais, e no momento oportuno a gente vai recorrer para recuperar meus direitos”, disse em exclusividade a Oeste. Ele diz estar confiante na retomada de sua elegibilidade.
Beraldo, por sua vez, é comentarista na rádio Jovem Pan News e foi secretário municipal de Turismo do Rio de Janeiro. Oriundo de família de políticos, o empresário é sobrinho-bisneto do ex-presidente Delfim Moreira e neto de Bilac Pinto, que foi ministro do Supremo Tribunal Federal. Para ele, sua exposição diária em uma emissora de grande audiência é um ponto que lhe é favorável. “É um público que, boa parte dele, não me conhecia e, a partir da Jovem Pan, começou a ter comigo um ponto de contato muito bacana.”
No entanto, a candidatura presidencial do humorista Danilo Gentili, ventilada há anos por membros e apoiadores do MBL, não está descartada. “O convite pra ele sempre esteve feito, se ele quiser participar das prévias estará convidadíssimo”, afirmou Renan.
Ele pondera, porém, que o trabalho do humorista pode ser um empecilho. “Danilo tem uma vida profissional e sabe muito bem as pressões que as emissoras passam”, comentou, fazendo referência ao SBT, onde o comediante trabalha. “A gente sabe que uma Janja ligando incomoda muita gente.”
Um dos motivos que impulsionaram a criação de um partido próprio foi a negativa por parte do União Brasil para que o deputado federal Kim Kataguiri (SP) fosse candidato a prefeito de São Paulo, cargo ao qual chegou a 10% das intenções de voto nas pesquisas pré-eleitorais.
Em vez disso, o partido preferiu apoiar o atual prefeito Ricardo Nunes (MDB), que concorria à reeleição e venceu a disputa. “Ter a nossa independência e decidir qual são as candidaturas majoritárias que a gente pode ter é uma questão fundamental para a gente poder estruturar o nosso projeto”, disse Kataguiri a Oeste.
Renato Battista, um dos porta-vozes do movimento, foi enfático: “Kim só vai deixar de ser candidato se for por outro colega de Movimento Brasil Livre.”
“Não vai ter Milton Leite, União Brasil que nos fará desistir”, discursou Renan. “Nós não apoiaremos nenhum outro candidato, essa é uma decisão política”.
Apesar dos reveses, o MBL obteve o melhor resultado eleitoral de sua história neste ano. Ao todo, foram eleitos 13 vereadores em todo o país, além de uma vice-prefeita. Juliana Lima (PSD), da pequena cidade de Meridiano, na região de São José do Rio Preto (SP), é a primeira representante do MBL no Poder Executivo.
A cidade deve ser a principal destinatária de emendas parlamentares de Kataguiri e do deputado estadual Guto Zacarias (União). “Vamos revolucionar a história de Meridiano e, daqui um ano ou dois anos, quero que vocês nos cobrem por isso”, disse Zacarias. “A gente vai pegar todas as métricas objetivas da cidade, como educação, segurança pública, economia e saúde, e vamos melhorá-las.”
MBL, Missão e Valete
O partido Missão não irá substituir o Movimento Brasil Livre, entidade fundada em 2014 que articulou o impeachment da então presidente Dilma Rousseff (PT), dois anos depois. Em mapa mental divulgado durante o evento, o MBL apresentou seus três ramos: o próprio movimento, dedicado ao ativismo digital, à organização de núcleos de militância, à promoção de eventos e à formação de militantes; a Missão, partido que formará quadros e lançará candidatos através da instituição de diretórios municipais e estaduais; e a Valete, unidade de produção cultural do movimento.
O partido terá como fundamento o Livro Amarelo, obra ainda em desenvolvimento que reunirá todo o projeto de país do MBL. Entre os temas abordados, estão economia, liberdade de imprensa, desenvolvimento sustentável, saúde, industrialização do Nordeste, defesa e soberania nacionais.
“A ideia da Missão é consolidá-la institucionalmente enquanto projeto. A gente não está tenso ou desesperado por colocar políticos para dentro, porque não é essa a ideia”, revela Renan a Oeste. “Se vai passar da cláusula de barreira ou não, isso não interessa. Hoje, nosso grupo político tem faturamento para não depender do fundo partidário”.
No mesmo sentido, Arthur do Val confirmou que é necessário que o partido lance um candidato à presidência. “Quando você tem a majoritária e você tem a personificação do que você acredita, você dá sentido a outras chapas ao redor do Brasil.”
A cláusula de barreira é uma norma que define que somente terão acesso aos recursos do fundo partidário e à propaganda gratuita em rádio e televisão os partidos que alcancem ao menos um dos critérios: a eleição de pelo menos 11 deputados federais, distribuídos em pelo menos nove unidades da Federação; ou a obtenção de, no mínimo, 2% dos votos válidos nas eleições para a Câmara dos Deputados, distribuídos em pelo menos nove unidades da Federação, com um mínimo de 1% dos votos válidos em cada um deles.
A Missão não deve se limitar a classificações como “direita”, “conservadora” ou “liberal”, segundo Arthur. “Hoje, você ser de direita, infelizmente, para a maior parte das pessoas, significa ser um cara brega, um cara bobo, um apoiador cego do Bolsonaro, um cara que se precisar apoiar cag*r na mesa do Alexandre de Moraes, ele apoia porque acha que isso vai ser uma revolução”, considera. “A gente tem que consertar o rótulo, o que eu acho mais difícil, ou nos desprender dele.”
Renan afirma que a intenção da Missão é cativar os brasileiros das gerações millennial e Z, ou seja, nascidos entre 1981 e 2012. “Nós falamos para uma geração, então não precisamos abrir concessão para outras gerações”, disse ele. “Se a gente domina a geração Z e a geração millennial, vai demorar um pouquinho mais, mas vamos chegar sempre dominando”, especialmente quando houver a substituição natural das gerações mais velhas pelas mais jovens.
Por fim, a Valete embasará a construção cultural de seus apoiadores e membros. Sua principal iniciativa é a Revista Valete, produto impresso que já está em sua 21ª edição, com uma tiragem mensal de cerca de 5 mil exemplares. Além disso, o projeto também contará com um clube do livro, uma editora e cafeterias espalhadas por todo o país. “É um trabalho de formiguinha”, disse Paulo Cruz, articulista da revista. “A gente tem que insistir na qualidade e aguardar que as pessoas comecem a se interessar por isso.”
Uma nova Constituição
A mais impactante das novidades apresentadas durante o evento foi o projeto de uma nova Constituição Federal por parte da Missão. “Se a gente quiser mudar o Brasil de verdade, não adianta a gente tratar de assuntos pela metade”, considerou. “O pacto está errado, se não reformá-la completamente, é propor uma nova constituição.”
Para Renan, o maior sintoma de que a Constituição de 1988 morreu são as jornadas de 2013. “As pessoas saíram às ruas porque o que a Constituição de 1988 prometeu, que eram direitos, o Estado bancando tudo, as travas que eles colocaram na produção, aquilo fracassou.”
Desde então, ele considera que o Brasil vive um constante processo revolucionário até hoje. “A questão central é: do jeito que está, não dá”, reitera. “A gente vai continuar fingindo que a gente vive numa democracia quando a gente sabe que vive numa farsa.”
“O que foi acordado entre MDB e Arena, naquele tempo da ditadura, e aqueles partidos que depois surgiram deles, que basicamente criaram a Constituição de 88, foi uma cleptocracia e um regime fictício de elites que administram o Brasil de maneira ilegítima e evocam a Constituição só para quebrá-la ou para usá-la para manter seus próprios privilégios.”
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