Guerra na Síria ressurge e expõe contradições do Irã

O fato de uma guerra estar adormecida não significa que ela acabou. Exemplo disso é a Guerra da Síria, iniciada em 2011, cujos combates recomeçaram em algumas regiões do país.

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Como em várias áreas do Oriente Médio, o silêncio local, de cerca de cinco anos, atendia mais a interesses do governo, que tomou algumas posições e “vendeu” a ideia da vitória como um disfarce.

Pura camuflagem, tão comum ao estilo de ditadores e grupos terroristas na região. A encenação desviava, de forma distorcida, o foco dos próprios problemas para um único culpado. No caso, Israel.

Em algumas horas, no dia 30 de novembro, Aleppo, a segunda maior cidade síria, passou ao controle de forças sunitas, lideradas pelo Hayat Tahrir al-Sham (HTS), antiga Frente Al-Nusra.

O grupo, que se dissociou da Al-Qaeda em 2016, estava à espera de uma oportunidade para mostrar ao mundo que a vitória do governo de Bashar Al-Assad, presidente sírio, era uma ilusão. Tomou a região, depois de eliminar soldados sírios e oficiais iranianos.

Escancarou, com isso, a essência contraditória do Irã, do Hezbollah e de outros grupos anti-Israel, que se digladiam para manter o poder e seus interesses na Síria.

Era tudo o que o Irã não queria neste momento, conforme afirmou o pesquisador Benny Sabati ao Maariv, sobre este ataque sofrido pelo Irã, de autoria do HTS.

Mas, em vez de reagir com mísseis balísticos, como fez com Israel, o regime iraniano se calou. Nenhum governante ou aiatolá esbravejou contra os sunitas, em um indício de que o Irã, além de desnudado em seus interesses, está enfraquecido militarmente.

“O comando deles [iranianos] foi eliminado, seus soldados e comandantes de campo – muitos dos quais estão no Hezbollah, Hamas e outros grupos”, observou Sabati. Desta maneira, “o Irã entra na campanha na Síria em um estado muito fraco; não tem meios de ajudar o regime de Assad.”

O Irã entrou em uma encruzilhada e, desgastado, se vê, no atual contexto, incapaz de prestar assistência. Além de ser ele próprio alvo dos sunitas.

“Atacaram um general e vários membros da Guarda Revolucionária Islâmica (IRGC), mataram-nos e capturaram o consulado iraniano. Por um lado, o Irã não pode ajudar; por outro, tornou-se ele próprio um alvo.”

Em abril último, ataque atribuído a Israel despertou a fúria iraniana, de maneira desproporcional à atual reação passiva. Na ocasião, entre os sete comandantes da IRGC, mortos em bombardeio ao consulado iraniano de Damasco, estava Mohamed Reza Zahedi, principal comandante da corporação.

Zahedi era um alto comandante da Força Quds, o braço paramilitar de elite da IRGC, que coordena o relacionamento com governos e grupos aliados de Teerã.

Outro comandante que morreu foi o general Mohamed Hadi Haji-Rahimi, que comandava a Força Quds na Síria e no Líbano, na prestação de ajuda militar tanto ao regime de Bashar al-Assad quanto ao grupo terrorista Hezbollah.

O ataque de abril foi pretexto para o lançamento de quase 200 projéteis iranianos contra Israel, na primeira ação direta do país persa contra o país judaico.

Em relação à agressão sunita do fim de novembro, porém, até agora não houve sinal de resposta iraniana.

Recrudescimento da guerra

O jeito, para o governo do Irã, foi recorrer à Rússia, que também fez parte da aliança pró-Assad.

O Irã buscava auxílio para definir alguma reação ao último ataque sunita. A Rússia, porém, também está sobrecarregada com a guerra na Ucrânia.

“O desenrolar desses eventos pode levar a um enfraquecimento tanto do Irã quanto do regime sírio, dependendo da resposta russa”, afirma a Oeste Karina Calandrin, assessora acadêmica do Instituto Brasil-Israel e doutora em Relações Internacionais.

“Se Moscou intervier para suprimir a rebelião, o cenário poderá mudar. Caso contrário, a estabilidade regional corre sério risco, com potenciais repercussões no equilíbrio de poder no Oriente Médio.”

As forças de Assad, com auxílio da Rússia, do Irã e do Hezbollah, controlam a maior parte do país. No nordeste sírio, os EUA mantêm tropas em apoio às Forças Democráticas Sírias, lideradas por curdos.

O noroeste é controlado pelos rebeldes que têm o apoio da Turquia, inimiga dos curdos. Em 2020, Rússia e Turquia entraram em um acordo para uma trégua na região.

O envolvimento do Irã no atual conflito contra Israel resultou em um desgaste significativo de seus recursos e influência para continuar mantendo este equilíbrio, ainda que falso.

“A recente escalada na Síria não apenas destaca as limitações iranianas, mas também sinaliza possíveis mudanças no equilíbrio regional, dependendo das ações de atores-chave como a Rússia e das dinâmicas internas dentro do Irã”, observa Calandrini.

O HTS foi o responsável por iniciar os ataques recentes em Aleppo. Liderado por Abu Mohammed al-Golani, a organização domina também a região de Idlib, no noroeste da Síria.

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Rússia, Estados Unidos, Turquia e Síria definem o HTS como um grupo terrorista. Mas onde fica o Hamas, também radical sunita, nesta história?

A situação na Síria impele o xiita Hezbollah, assim como o Irã, para um lado oposto ao do Hamas, ao qual se uniu depois dos ataques de 7 de outubro. O novo (e antigo) cenário pode isolar o grupo terrorista na defesa contra as Forças de Defesa de Israel em Gaza.

Para a Síria e o Irã, a guerra contra Israel era interessante. Desviava o foco e mantinha um aparente equilíbrio de forças na Síria. Isso até deu margem para uma aliança entre sunitas do Hamas e xiitas do Hezbollah. Mas o recrudescimento da guerra na Síria reacendeu muitos interesses escondidos na retórica contra Israel. Era tudo o que o Irã não queria.

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