Ansiedade tem ligação genética com gordura corporal, mostra estudo

Uma equipe internacional de pesquisadores liderada por especialistas da Universidade de Bristol revelou, em estudo publicado na revista Nature Communications, que a gordura corporal pode desempenhar um papel causal no desenvolvimento de sintomas de ansiedade.

O trabalho, que utilizou técnicas avançadas de randomização mendeliana multivariada, sustenta que “as associações observadas entre a adiposidade e a ansiedade são em parte causais, com direção da gordura para a ansiedade, e não o contrário”.

O estudo se baseia em extensos bancos de dados genéticos e fenotípicos — como o UK Biobank, o GIANT Consortium e o Psychiatric Genomics Consortium — com centenas de milhares de indivíduos.

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Os autores investigaram a relação entre três medidas distintas de adiposidade: índice de massa corporal (IMC), porcentual de gordura corporal e gordura subcutânea abdominal, e os sintomas de ansiedade em dois tipos de fenótipo: traços contínuos e diagnóstico clínico.

A escolha da abordagem estatística foi fundamental para o rigor dos achados. Segundo os autores, essa técnica permite inferências causais mesmo quando ensaios clínicos são impraticáveis, por meio da análise de variantes genéticas que funcionam como instrumentos naturais.

Os resultados da pesquisa demonstraram que, “no geral, há evidência consistente de que a adiposidade, especialmente a gordura subcutânea abdominal, tem efeitos causais sobre os sintomas de ansiedade”.

A ansiedade é um estado emocional caracterizado por sentimentos de medo, preocupação ou insegurança | Foto: ShutterStock

A análise reforçou esse achado ao mostrar que, mesmo que controle as demais formas de adiposidade, a gordura abdominal continuava a apresentar uma associação com ansiedade. Para os autores, “isso sugere que a distribuição de gordura pode importar tanto quanto a quantidade total, destacando a importância do tecido adiposo abdominal”.

Um dos pontos mais relevantes foi a ausência de causalidade reversa. “Não encontramos nenhuma evidência de que sintomas de ansiedade causem aumento da adiposidade em qualquer das medidas analisadas”, destaca. A constatação contraria a hipótese comum de que a ansiedade leva ao ganho de peso por meio de comportamentos como alimentação emocional ou sedentarismo.

Além da análise estatística, os pesquisadores se debruçaram sobre possíveis mecanismos biológicos. A gordura corporal, especialmente a abdominal, é metabolicamente ativa e produz citocinas inflamatórias e hormônios como leptina e adiponectina, que podem interferir em vias neurais.

Sinais químicos da gordura chegam ao cérebro e afetam a ansiedade

“Propomos que essas vias bioquímicas podem mediar a influência do tecido adiposo sobre sistemas cerebrais ligados à regulação do humor, como o eixo hipotálamo-hipófise-adrenal e os circuitos do medo”, explicam os autores.

A discussão também abordou diferenças por sexo, idade e contexto clínico. Embora os efeitos tenham sido mais evidentes em análises com grandes amostras populacionais, foram replicados em subgrupos e diferentes coortes.

“Os efeitos foram consistentes entre os sexos, mas análises específicas sugerem que a magnitude da associação pode ser maior em mulheres”, afirmam. Essa constatação reforça dados epidemiológicos de maior prevalência de ansiedade entre mulheres e sugere que parte dessa diferença pode ser mediada por fatores biológicos.

obesidade
A obesidade é um distúrbio de saúde caracterizado por um excesso de peso corporal | Foto: Reprodução/Agência Senado

Mesmo com o rigor metodológico, os autores alertam para limitações. A randomização mendeliana detecta apenas efeitos mediados geneticamente e desconsidera variáveis ambientais ou contextuais.

“A genética explica uma proporção limitada da variância fenotípica, e os resultados devem ser interpretados no contexto de outros fatores, como estresse, estilo de vida e ambiente socioeconômico”, escreveram.

O estudo representa um passo importante na compreensão da interseção entre obesidade e saúde mental. Ao demonstrar que a gordura corporal — sobretudo a abdominal — pode contribuir para o surgimento de sintomas ansiosos, os autores sugerem que o tecido adiposo deve ser entendido como “um órgão endócrino e imunológico com impacto sobre a função cerebral”.

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As implicações clínicas são relevantes. Estratégias para reduzir a gordura corporal podem ter efeitos benéficos não apenas físicos, mas também psicológicos. Intervenções de saúde pública, medicamentos ou abordagens comportamentais poderiam ser ajustadas com base nesse novo entendimento.

“Nossos achados apoiam a ideia de que tratar a obesidade pode auxiliar também na prevenção ou mitigação de transtornos ansiosos, especialmente se focarmos na gordura abdominal”, reforçam os pesquisadores.

Em última instância, o trabalho demonstra que o elo entre corpo e mente é também biológico, e não apenas fruto de estigmas sociais ou escolhas individuais. Como os autores demonstram, “uma abordagem integrada, que considere a biologia do tecido adiposo, pode ajudar a desenvolver intervenções mais eficazes e menos estigmatizantes”.

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