Mesmo que seja aprovada no Congresso e sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), a proposta que altera a Lei da Ficha Limpa pode ser inútil para reabilitar o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) nas eleições de 2026. A análise é do jornal Gazeta do Povo.
A mudança reduziria de oito para dois anos o período de inelegibilidade para condenações por abuso de poder político e econômico em campanhas eleitorais.
Bolsonaro aposta nesse projeto de lei para anular duas condenações recebidas no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em 2023, que o tornaram inelegível até 2030.
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O PLP 141/2023, de autoria do deputado Bibo Nunes (PL-RS), está pronto para ser analisado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara. O projeto conta com apoio não apenas da direita, mas também de uma parcela significativa do centrão, pois beneficiaria vários outros políticos cassados.
Nesta sexta-feira, 7, Bolsonaro publicou um vídeo nas redes sociais defendendo a mudança. “Estamos trabalhando para que esse período passe de oito para dois anos de inelegibilidade, e aí, sim, eu poderia disputar as eleições em [20]26, e você vai decidir se vai votar em mim ou não”, afirmou.
Antes disso, o ex-presidente chegou a defender uma alteração mais radical: a revogação completa da lei, que ele considera existir apenas para perseguir a direita.
Bolsonaro argumentou ainda que a ex-presidente Dilma Rousseff, mesmo depois do impeachment, voltou a ser elegível, e que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, depois de ser condenado em três instâncias, pôde concorrer ao ser “descondenado” pelo STF.
“Temos a justiça comum, o Código Penal, a lei de improbidade administrativa, entre outras, para punir políticos criminosos”, declarou o deputado Bibo Nunes ao jornal Gazeta do Povo. “Não é o tempo de inelegibilidade que pune um político corrupto. Oito anos é um período muito longo e serve para punições políticas, não criminais.”
Mudança pode não surtir efeito no caso de Bolsonaro
O problema, no caso de Bolsonaro, é que a mudança pode não surtir efeito por dois motivos. O primeiro é a possibilidade de o STF declarar a nova lei inconstitucional. O segundo é a chance de a Corte condenar Bolsonaro criminalmente por tentativa de golpe, afastando-o das urnas por um período muito além de 2030.
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Em entrevista à Gazeta do Povo, o advogado eleitoral Fernando Neisser, afirma que o STF pode considerar a alteração inconstitucional por proteger de forma insuficiente a moralidade nas eleições.
A Constituição determina que uma lei complementar estabeleça os casos de inelegibilidade “a fim de proteger a probidade administrativa, a moralidade para exercício de mandato, considerada vida pregressa do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta”.
Na legislação brasileira, isso está previsto na Lei Complementar 64/1990, que foi atualizada em 2010 com a criação da Lei da Ficha Limpa. Antes dessa mudança, o prazo de inelegibilidade era de três anos depois do trânsito em julgado de condenações criminais, ou seja, depois do encerramento definitivo do processo.
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Na prática, políticos condenados continuavam concorrendo porque conseguiam recorrer indefinidamente até que a punição prescrevesse ou fosse anulada. Com a Lei da Ficha Limpa, além de o prazo de inelegibilidade ser ampliado para oito anos, a contagem passou a ocorrer depois da condenação por um tribunal, de forma imediata.
Para Neisser, a inconstitucionalidade pode ocorrer se o STF aplicar o princípio da proteção insuficiente de um bem jurídico.
“Se a lei reduzisse a pena de homicídio para dois meses, o STF poderia declarar inconstitucional por não proteger de maneira suficiente o direito à vida”, exemplifica.
Em outras palavras, uma punição tão branda não seria suficiente para fazer um potencial homicida desistir de matar uma pessoa, deixando-a desprotegida. O mesmo se aplicaria à moralidade e legitimidade das eleições contra o abuso de poder político e econômico.
Se o projeto eventualmente reduzir também o prazo de inelegibilidade para outras causas – como condenações por crimes comuns ou eleitorais, improbidade administrativa, cassação de mandato por quebra de decoro, impeachment, etc. –, o STF teria ainda mais motivos para declarar a alteração inconstitucional, por causar uma proteção insuficiente à moralidade na ocupação de cargos públicos.
Outra possibilidade de o STF barrar Bolsonaro seria decidir que a redução do prazo de inelegibilidade só valeria para condenações futuras. Assim, ele ficaria de fora de 2026, já que foi condenado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em 2023.
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A chance de Bolsonaro se beneficiar de uma interpretação que lhe permita concorrer é pequena, já que a Corte já decidiu em 2010 que a ampliação do prazo de inelegibilidade deveria ser aplicada também a condenações anteriores.
Outro fator que pode tornar a mudança na Ficha Limpa irrelevante para Bolsonaro é a possibilidade de uma nova condenação no inquérito que investiga a suposta tentativa de golpe.
A Procuradoria-Geral da República (PGR) está prestes a denunciá-lo por três crimes: tentativa de golpe de Estado, tentativa de abolição do Estado Democrático de Direito e organização criminosa. Se for condenado, Bolsonaro pode pegar penas que somam ao menos 15 anos de prisão.
O post STF pode impedir reabilitação eleitoral de Bolsonaro com mudança na Ficha Limpa apareceu primeiro em Revista Oeste.