Terry Malloy é um homem em conflito. No banco de trás do carro, seu irmão mais velho, Charley, apresenta um desespero inesperado. Para quem sempre foi sua referência, Charley, com seu chapéu de detetive e o sobretudo de mafioso, faz uma oferta a ele: “Há uma vaga para chefe no píer, estamos abrindo”, diz ele. “Pagam 6 centavos para cada 45 kg que entram ou saem. Não precisa mover um dedo, são uns US$ 400 por semana.”
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Malloy, então, lança um olhar distante, com angústia. E não aceita. O seu olhar se tornou uma imagem marcante do cinema. Ele é interpretado por Marlon Brando e seu irmão Charley por Rod Steiger, em Sindicato de Ladrões (On the Waterfront), de 1954, disponível em plataformas como HBO Max e Apple TV. Elia Kazan foi o diretor.
Kazan foi membro do Partido Comunista e, anos depois, se tornou um anticomunista por conhecer de perto as mazelas desta ideologia.
O filme explora o dilema interno de Malloy. Ele é homem dividido entre a tentação da vida fácil e a luta contra a corrupção. No carro, está propenso a delatar o grupo e o irmão tenta convencê-lo do contrário.
A cena é bonita porque, em meio à exasperação de Charley, ele não consegue esconder o amor e o instinto de proteção em relação ao caçula.
Neste domingo, 30, completam-se 70 anos desde que Sindicato de Ladrões conquistou o Oscar. Mesmo depois de tanto tempo, o filme continua atual, especialmente quando se observa a realidade de muitos sindicatos no Brasil.
A ética de Malloy ganha destaque quando, a mando de seu chefe, ele, sem saber, atrai para a morte um homem bom prestes a denunciar o grupo.
Malloy, protegido do chefe, é um ex-lutador de boxe frustrado. Destruiu sua carreira por causa de apostas.
O sindicato, chefiado por Johnny Friendly (Lee J. Cobb), se envolvia em crimes como a exploração de trabalhadores no porto de Nova York, manipulando cargas e se beneficiando de subornos. Quem tentava delatar o esquema era assassinado. Friendly mantinha seu poder através de ameaças constantes e controle sobre os membros do sindicato.
O dilema de Malloy, sempre trajando jaquetas de estilo rebelde, ganha força quando ele conhece Edie Doyle (Eva Marie Saint), irmã da vítima, e descobre a força dela por trás do luto. Malloy também se encanta com os sermões do padre Barry, um homem corajoso que desafia a máfia.
Protagonista e coadjuvante
A profundidade com a qual Brando expôs essa turbulência interna o elevou, com seu carisma de galã, à condição de um dos maiores nomes, senão o maior, da história do cinema.
Karl Malden, que interpreta o padre, também tem performance notável. Especialmente na cena em que, depois de criticar abertamente o roubo do sindicato, ele é erguido por um elevador de carga, sendo reverenciado pelos próprios criminosos.
A cena se passa em um depósito industrial, utilizado para armazenar mercadorias. Ficou como o símbolo de um “tribunal” onde a honestidade do padre repudia a corrupção dos criminosos. Eles mesmos baixam a cabeça diante da culpa, em uma bela sacada de Kazan.
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Embora Brando tenha levado o Oscar por sua interpretação, é interessante pensar que Karl Malden, que já havia sido premiado em 1952 por sua atuação em Um Bonde Chamado Desejo (A Streetcar Named Desire), não se importaria em, desta vez, não ser reconhecido como o melhor coadjuvante.
Premiados ou não, muitos coadjuvantes têm uma função tão ou mais importante que a do principal. Generosos, ajudam a dar mais brilho ao protagonista. Mesmo que ele seja ninguém menos do que Marlon Brando.
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