‘Lula e Xi Jinping cultivam relação de amizade’, afirma artigo do WSJ

Enquanto o ditador chinês Xi Jinping se prepara para relações comerciais conturbadas com Donald Trump, que será presidente dos Estados Unidos a partir de janeiro, ele também cultiva uma relação de amizade com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Um artigo publicado no jornal norte-americano The Wall Street Journal discorre sobre a relação entre os líderes.

Xi Jinping já classificou Lula como “bom amigo com ideias semelhantes”. O populista de esquerda compartilha com Xi o objetivo de conter a dominância econômica global dos EUA. Quando os dois se encontraram esta semana em uma reunião do G20, Lula puxou o líder chinês, conhecido por sua postura rígida, para um abraço.

“O calor na relação — com um encontro individual entre os dois previsto para quarta-feira em Brasília — é sustentado pelas necessidades econômicas mútuas dos dois países”, destaca o WSJ.

A economia chinesa, sedenta por recursos, depende de minério de ferro, soja, carne bovina, petróleo e outras commodities brasileiras a ponto de o Brasil ser um dos poucos países com superávit comercial com a China, seu maior parceiro comercial. Por outro lado, o Brasil procura semicondutores, fertilizantes, aço, autopeças, produtos químicos e veículos chineses.

De acordo com o WSJ, os laços entre a China e o Brasil — maior economia da América Latina — podem ajudar Pequim a mitigar os impactos das tarifas de Trump em sua economia já enfraquecida.

Esses vínculos também demonstram como rotas comerciais alternativas podem contornar os EUA. Por exemplo, a China pode aumentar as importações de soja do Brasil e reduzir a compra de agricultores americanos em uma disputa comercial.

Os interesses pessoais de Lula e Xi Jinping

O artigo também relata que Xi Jinping e Lula têm interesses pessoais em demonstrar solidariedade um ao outro. Lula priorizou a China em cada um de seus três mandatos como presidente. Ambos os líderes se beneficiam ao tratar o outro como parceiro confiável.

Depois de retornar à presidência no ano passado, sucedendo o aliado de Trump, Jair Bolsonaro (PL), Lula fez da China sua primeira visita fora das Américas. A visita de Xi esta semana é sua terceira ao Brasil como líder chinês.

“Há uma afinidade natural na forma como o Brasil, especialmente Lula, e a China veem o mundo”, disse Jason Marczak, especialista em América Latina no Atlantic Council, em entrevista ao WSJ. “O Brasil quer ‘uma diversificação de parceiros’, e, na era Trump, a China precisa de alternativas aos EUA”, acrescentou.

Quando Xi recebeu Lula em Pequim em abril do ano passado, uma banda militar tocou uma música brasileira favorita, A New Era, do músico carioca Ivan Lins, emocionando parte da delegação brasileira. Lula caminhou orgulhoso pelo tapete vermelho, trocando sorrisos com seu homólogo chinês, antes de prometer impulsionar os laços comerciais.

Neste ano, Lula também declarou que os laços Brasil-China são “cada vez mais importantes para a construção de uma ordem multipolar”.

União contra Elon Musk

Lula e Xi Jinping durante encontro na China | Foto: Ricardo Stuckert/PR/Agência Brasil

No Rio, a presença da China na economia brasileira foi ilustrada por uma tela digital de vários andares próxima ao hotel da área de Copacabana onde o atual presidente dos EUA, Joe Biden, estava hospedado para a reunião do G20.

A tela exibiu uma sequência de anúncios chineses de empresas como a montadora BYD, a produtora de petróleo Cnooc, a gigante química Sinopec, a estatal elétrica State Grid e a Huawei Technologies.

Nos encontros, Xi e Lula devem anunciar que o Brasil permitirá que a China lance satélites de comunicação em órbita baixa a partir do bem localizado Centro de Lançamento de Alcântara.

De acordo com o WSJ, isso poderia impulsionar Pequim na emergente corrida espacial com os Estados Unidos e oferecer a Lula novas opções para coordenar comunicações sobre o vasto território brasileiro, incluindo a Amazônia.

Os líderes também devem discutir a recente aquisição pela BYD de uma antiga fábrica da Ford, marcando o primeiro marco da fabricante de veículos elétricos na América.

Para a publicação, ambos os projetos podem ser uma “preocupação” para Elon Musk, bilionário apoiador de Trump, que lidera o maior sistema de satélites de órbita baixa do mundo, o Starlink da SpaceX, e a fabricante de carros elétricos Tesla.

Ecos de Moscou

Xi e Lula criticam o domínio do dólar nas transações globais e apoiam esforços entre os membros do BRICS, que também inclui Rússia, Índia e África do Sul, para usar outras moedas no comércio e talvez criar uma unidade própria.

O WSJ avalia que a parceria Xi-Lula carrega ecos da relação “quase romântica” de Xi com Vladimir Putin. No entanto, enquanto a economia da China é amplamente maior que a do Brasil e da Rússia, Lula não é tão dependente de Pequim quanto Putin.

O relacionamento de Lula com Xi é mais baseado em negócios do que em geopolítica, o que o torna menos provocativo aos EUA do que os laços de Xi com Putin.

“Quando necessário, Lula ainda está mais alinhado com Washington”, disse Leolino Dourado, pesquisador da Universidad del Pacífico.

Lula e Xi Jinping versus Trump

“Quando as coisas apertam, a nação democrática de Lula da Silva está mais alinhada com Washington, uma relação que ele ainda precisa gerenciar”, afirma o WSJ. Biden e Lula tiveram um almoço de trabalho em meio à agitação do G20. Diferente de Xi, que busca substituir as instituições lideradas pelos EUA no pós-guerra, Lula está mais interessado em reformar as existentes para “dar mais voz” a nações como o Brasil.

Durante uma semana, a visita de Xi à América Latina, que incluiu a inauguração de um grande porto no Peru, destacou o crescente impacto da China na região. Isso ofuscou a primeira visita de Biden à América do Sul como presidente — considerada na região como tardia demais.

A China imaginava que a assinatura de Lula em um acordo para que o Brasil se juntasse à iniciativa Cinturão e Rota seria o ponto alto de uma semana de conquistas chinesas na região. Essa iniciativa já foi aceita por grande parte da América Latina. Mas, poucos dias antes da cúpula, Lula esfriou essas expectativas.

Autoridades dos Estados Unidos haviam alertado publicamente o Brasil para considerar as implicações de aderir à iniciativa de infraestrutura da China, vista como uma estratégia de influência. No final, o principal assessor de política externa de Lula afirmou que a hesitação do Brasil reflete questões de “sinergia” — um lembrete de que a potência econômica da região não tem intenção de se tornar um Estado cliente de Pequim.

A relação do Brasil com a China dificilmente estará no radar de Trump de imediato. Seu foco principal na região será o México. “É difícil dizer o quanto Trump vai se importar com o Brasil”, disse Ryan Berg, acrescentando que Washington tende a tratar o Brasil como uma “relação opcional”.

A publicação ressalta que Elon Musk, que integrará o governo Trump, está observando a política brasileira. Durante um evento do G20 no fim de semana, a mulher de Lula, Janja Lula da Silva, insultou Musk com palavrões ao defender a regulamentação das redes sociais. Musk respondeu na plataforma Twitter/X afirmando que Lula “vai perder a próxima eleição”.

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