Uma ONG de Pernambuco, contratada pelo governo federal para fornecer refeições a pessoas em situação de vulnerabilidade social, apresentou uma lista de beneficiários com CPFs inconsistentes ou associados a nomes divergentes dos registros oficiais. A organização assinou um contrato de R$ 3 milhões com o Ministério do Desenvolvimento Social (MDS) em novembro de 2024 e registrou os documentos manualmente na prestação de contas.
O MDS suspendeu o termo de colaboração com a ONG e afirmou que, caso sejam confirmadas irregularidades, poderá exigir a devolução dos recursos já repassados. Em comunicado oficial, o ministério, sob a liderança de Wellington Dias, garantiu que tomará as providências necessárias para corrigir qualquer descumprimento do contrato ou má utilização dos recursos públicos.
As medidas possíveis incluem bloqueio de pagamentos, solicitação de ressarcimento dos valores e desqualificação da entidade no programa.
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A entidade se comprometeu a investigar qualquer suspeita de irregularidade
A prestação de contas com os CPFs problemáticos foi enviada pela Associação da Juventude Camponesa Nordestina Terra Livre. Ana Lúcia Gusmão Brindeiro, vice-presidente da organização, também trabalha como funcionária no gabinete da deputada estadual Rosa Amorim (PT), mesmo partido do ministro.
Em nota, a entidade se comprometeu a investigar qualquer suspeita de irregularidade. A deputada, por sua vez, alegou que as funções de sua assessora na ONG não possuem vínculo com seu trabalho no gabinete.
O presidente da Terra Livre, Sandreildo José dos Santos, admitiu a possibilidade de erros no preenchimento da lista de beneficiários. Entre os 400 nomes apresentados, ao menos 150 possuem CPFs inválidos, segundo apuração do jornal O Globo. O CPF, emitido pela Receita Federal, segue uma sequência numérica validada por um algoritmo.
“Nós temos alguns problemas”, disse Santos. “Essas cozinhas trabalham com povo de rua, muita dificuldade com documento. Mas se tiver indícios de ingerência, a gente vê.”
Contrato com a ONG foi firmado no Programa Cozinha Solidária, do governo Lula
A formalização do contrato com a ONG ocorreu dentro do Programa Cozinha Solidária, iniciativa do governo Lula para combater a fome. A entidade subcontratou outras ONGs em diferentes municípios de Pernambuco para a distribuição das refeições. Uma delas, a Uma Gota de Esperança, foi responsável pela entrega das quentinhas em Paulista (PE), município com 342 mil habitantes na Região Metropolitana do Recife.
A lista com CPFs inconsistentes está vinculada a essa organização. Indagada pelo O Globo sobre os erros, Thais de Moraes Wanderley, responsável pela ONG, atribuiu as falhas aos próprios beneficiários.
“As pessoas, quando vêm buscar a comida, elas assinam, colocam o CPF e a data”, disse a responsável pela ONG. “Acredito que esteja acontecido isso. Elas dão “de cor” e devem informar qualquer número de CPF. Até eu estou abismada agora.”
Entre os CPFs registrados na lista da ONG, um pertence a Jorgiana de Paula Wanderley Gomes, prima do marido de Thais. No entanto, o nome associado ao número na documentação da entidade é Erika da Silva.
Ao ser questionada sobre a discrepância, Thais não respondeu. Procurada, Jorgiana negou inicialmente ter recebido refeições do programa, mas posteriormente afirmou que o registro correspondia a uma cesta básica fornecida pela ONG. Entretanto, a distribuição de cestas básicas não faz parte do Programa Cozinha Solidária, e ela não esclareceu o motivo de seu CPF estar vinculado a outro nome.
Além desse caso, pelo menos cinco outros registros apresentam divergências entre os CPFs informados e os nomes cadastrados no banco de dados do governo, incluindo o sistema do Auxílio Emergencial.
O caso se repete
Recentemente, O Globo revelou que o Ministério do Desenvolvimento Social também firmou contrato com outra entidade suspeita, a associação Movimento Organizacional Vencer, Educar e Realizar (Mover Helipa), chefiada por um ex-assessor do PT. A ONG recebeu R$ 5,6 milhões para distribuir alimentos na periferia de São Paulo e, posteriormente, transferiu parte dos recursos para organizações lideradas por ex-integrantes de gabinetes petistas.
O jornal visitou os endereços indicados ao governo federal para a produção e distribuição dos alimentos e não encontrou indícios de que as refeições estavam sendo preparadas ou entregues. O ex-assessor responsável pela entidade alegou desconhecer a ausência das quentinhas e minimizou o fato de os subcontratados serem ligados ao PT.
Assim como ocorreu com a ONG pernambucana, o contrato com a Mover Helipa também foi suspenso. O MDS acionou a Polícia Federal (PF) e a Controladoria-Geral da União (CGU) para investigar possíveis irregularidades nos repasses de verbas e na execução do programa.
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